terça-feira, 20 de dezembro de 2011

Episódio 27


Lívia havia voltado para Santos e estava bem mais voraz e perigosa. Kara continuava sugerir os melhores recrutas para integrar o exército de Freya, e Lívia, agora sob o domínio mental de Moloch, não tinha mais forças para suportar sua fome. Já não ficava espectral há algum tempo e não se importava mais com isso. Havia voltado para sua casa, saía apenas à noite para se alimentar, preferencialmente daqueles que frequentavam os cais do porto. 


O dia já estava amanhecendo quando Lívia voltou para casa. Suas roupas ainda tinham respingos do sangue de sua última vítima. Sentia-se saciada, enquanto apreciava sua própria imagem no espelho. Agora carregava no pescoço o colar que havia ganhado do anão Alberich. A beleza daquela joia era única. O magnífico topázio era suspenso por uma corrente de ouro com um trançado único. Lívia era capaz de ficar admirando aquela joia por horas, assim como os homens também se perdiam em seus próprios desejos e pensamentos, hipnotizados pela beleza e pela sedução que aquela mulher era capaz de exercer sobre eles. 


Ela tirou suas roupas sujas de sangue e acomodou-se languidamente sobre a cama, vestindo apenas o colar. Logo adormeceu. Era apenas neste momento que conseguia pensar livremente. Em seus sonhos Moloch não podia dominar seus pensamentos, em contrapartida era obrigada a encarar aquele abominável demônio de frente. 

terça-feira, 6 de dezembro de 2011

Episódio 26

Alberich estava reunido com a alcateia. “Meus caros, como vocês sabem, nós, os anões de Asgard, somos a excelência na forja de metais. Usamos dessa nossa habilidade e da alquimia conseguida com a mais nobre flora encontrada na Mata Atlântica para fazer este elmo. Estou entregando-o a vocês para que convençam Lívia a usá-lo. Este elmo tem o poder de anular a influência de Moloch sobre a mente de Lívia. Somente assim teremos alguma chance no Ragnarok.”

“Mas como faremos isso? Lívia é um animal assassino sendo guiada por um demônio!” Marie estava preocupada.

“Agora será o momento de usarmos as armas que nossa pai Fenris nos deu.” Disse Lui a seus irmãos. “Usarei meus poderes para hipnotizar Lívia, enquanto Sebastian a amarra com suas correntes de seda. Assim que ela estiver totalmente detida, Marie coloca o elmo em sua cabeça. Não há como dar errado!”

“Excelente ideia! Sabia que vocês eram muito astutos. Mas preciso comunicar-lhes que Asgard é regido por leis de compensação. Antes de lhes entregar este elmo magnífico, entreguei a Lívia o colar mágico de Freya. Ele tem o poder de reforçar ainda mais os poderes psíquicos da felina, fazendo-a exercer o poder da lua cheia sobre os homens e sobre os lobos. Sua influência sedutora será ainda maior. Para não serem vítimas do caos que ela trará, os homens devem controlar suas próprias paixões.” Terminado seu recado Alberich simplesmente desapareceu.

segunda-feira, 28 de novembro de 2011

Episódio 25

Bernardo corria sem rumo pela Mata. Ao olhar para seu lado direito deparou-se com figura peculiar de um anão, flutuando e acompanhando sua corrida. O estranho ser então falou com Bernardo. “Acalme-se meu amigo. Sua fúria é o que Moloch deseja.” Bernardo estava cego de raiva e não conseguia parar de correr. “Moloch fica mais forte à medida que a raiva daqueles a quem ele quer atingir aumenta. Se continuar, logo não terá mais como lutar contra ele, e ele alcançará seu objetivo, que é destruir você.” Aos poucos Bernardo foi diminuindo a velocidade de sua corrida até se deixar cair, completamente prostrado.
“E quem ou o que é você?” disse Bernardo sem nenhum entusiasmo. ”Sou Alberich, estou aqui para orientar você. Não é o momento de esmorecer. Você é um lobo ou um poodle? Temos muito que fazer para evitar um embate com Moloch no Ragnarok.” Ainda desanimado, Bernardo perguntou a Alberich: “Mas lutar pelo quê e para quê? Não tenho mais objetivos, nem expectativas, muito menos esperança.” O anão olhou Bernardo por cima das lentes de seus óculos. “Com Moloch dominando Lívia e liderando o exército de Freya os lobos não terão nenhuma chance, e se vocês forem exterminados todos os seres de Asgard que vivem aqui na Mata Atlântica estarão ameaçados de desaparecer definitivamente.”

Bernardo estava surpreso. “Então Lívia matou Raquel porque está sob o domínio de um demônio?” Neste momento a resposta veio na voz determinada de Raquel. “Sim, precisamos fazê-la retomar o comando de sua mente, serão estaremos perdidos.”

sábado, 26 de novembro de 2011

Episódio 24

Enquanto isso, nas profundezas da mente de Lívia...

Lívia caminhava por entre rochas pontiagudas que circundavam pequenas crateras cheias de lava incandescente quando se deparou com Moloch. Sua figura era assustadora, corpo de homem e cabeça de touro. Tinha o corpo atlético de um dourado escuro, longos chifres, sua face parecia mesmo a de um touro e tinha os olhos vermelhos incandescentes, como se estivessem queimando.

Com uma voz de trovão em noite de tempestade, o irônico demônio disse: “Desista Lívia. Você está sob o meu total domínio. Lutar só vai te levar à exaustão. Entregue sua mente por inteiro a mim.”

Desesperada Lívia tapou os olhos com as mãos, ouviu o barulho de uma cachoeira e ao abri-los lentamente viu ao seu lado a figura peculiar de Freya, a grande felina com asas de falcão. A semelhança com ela própria era grande, afinal era sua descendente. A voz macia e confiante de Freya fez com que seu coração voltasse a bater compassadamente. “Lute querida, lute pelo que acredita, lute pelo seu amor. Não desista e será coroada de êxito.”

As águas claras da cachoeira viraram lava. Pelo meio da cachoeira saiu a figura de Moloch, gargalhando como um trovão.  

sexta-feira, 25 de novembro de 2011

Episódio 23

Enquanto Raquel agonizava nos braços de Bernardo, ele sentia-se culpado por ter sucumbido. Foi hipnotizado por aquela felina; não teve forças para evitar. O desespero tomava conta dele. Os pelos da face de Bernardo começavam a desaparecer e lágrimas brotavam de seus olhos. Elas gotejavam sobre o peito ferido de morte de sua amada. A respiração de Raquel tornava-se mais espaçada, até parar definitivamente depois de um profundo soluço.

Bernardo foi tomando consciência da insanidade que acabava de fazer. Acomodou delicadamente o corpo de Raquel no chão e com o coração tomado de um ódio incontrolável partiu à procura de Lívia.

Raquel ficou deitada sobre a terra úmida da Mata, e sem            que ninguém pudesse presenciar, as profundas perfurações feitas pelas garras de Lívia em seu peito começaram a cicatrizar. As lágrimas de Bernardo, milagrosamente, tiveram um poder curativo no corpo de sua amada. Ela abriu os olhos, levantou-se calmamente, e na forma de uma loba, partiu à procura de Bernardo.

domingo, 20 de novembro de 2011

Episódio 22


Bernardo agora tinha poderes que ele mesmo não conhecia. Era o lobo alfa, e sua missão evitar a extinção da alcateia. Sabia onde Raquel estava e sabia também que aquilo era uma emboscada, mas não podia deixar que sua loba continuasse enjaulada.

Escondido na mata, Bernardo viu Lívia na frente da jaula, asas fechadas como um pássaro que dorme. Armou o bote, e saltou sobre Lívia que não manifestou nenhuma reação. Antes que pudesse cravar seus dentes e suas garras nela sentiu aquele perfume doce e inebriante novamente, e isso o deixou sem reação. A fúria deu lugar à libido. A atração que tinha por aquela criatura era mais forte que sua capacidade de discernimento.  

A respiração de ambos começou a se alterar. Exalavam feromônios. O lobo uivou e a felina enroscou-se nele como uma gata dengosa. O lobo estava acomodando-se sobre Lívia quando Raquel tomada por uma fúria inexplicável quebrou a jaula e saltou sobre eles. Lívia deixou com que as garras felinas ficassem expostas cravando as unhas no peito da Loba.

Com os olhos vermelhos, Lívia abriu as asas e foi embora. Com uma grande hemorragia Raquel voltou à forma humana e nos braços também humanos de Bernardo ela agonizava.

segunda-feira, 14 de novembro de 2011

Episódio 21

Na floresta, em algum lugar bem próximo ao litoral, Raquel foi colocada dentro de uma jaula. Estava tão nervosa que não conseguia ficar na forma humana. A loba de pelos avermelhados dava voltas em círculos e uivava demonstrando todo seu ódio. Do lado de fora, Kara, a valquíria, tomava conta da refém. Lívia aproximou-se da jaula e com um sorriso irônico disse: Não perca seus últimos dias de vida com tanta irritação. "Bernardo jamais terá a chance de te resgatar. Você é a isca, Bernardo o objetivo. Mas nenhum dos dois sairá vivo do Ragnarok."
Depois de algumas horas Raquel deitou-se e voltou à forma humana. Quando estava começando a pegar no sono teve uma visão. Nela Lívia estava hipnotizada por Cirus num ritual de adoração a Moloch, um demônio muito poderoso.
Raquel acordou e viu Lívia parada uns metros adiante, como uma estátua, olhos e asas fechadas, como se dormisse. Sussurrando, Raquel se dirigiu a Lívia: "Eu sei que esta não é você. Moloch domina sua mente. Ele quer nos destruir usando você, mas conheço a sua essência. Aquela que guardou nosso segredo durante tanto tempo, nos aceitou e nos compreendeu não seria capaz de tamanha traição, ou seria? Que motivos você tem para nos odiar? Eu sim, tenho todos os motivos para te odiar. Você foi dissimulada. Amou o meu homem, o meu lobo, enquanto se fazia passar por minha amiga."
Lívia levantou a cabeça mostrando suas pupilas verticais envoltas pelo cristalino vermelho. "Cale a sua boa, senão morrerá antes mesmo do planejado." Momentaneamente os olhos de Lívia voltaram a ser azuis, ela baixou a fronte e lágrimas escorreram por sua face. Lágrimas que caíam ao chão transformando-se em pequenas pepitas de ouro.

quinta-feira, 10 de novembro de 2011

Episódio 20


Marie, Lui e Sebastian continuavam hospedados no apartamento de Raquel e Bernardo. Sabiam que até o Ragnarok não poderiam ir embora.

Bernardo sabia que agora tinha poderes suficientes para não precisar temer qualquer ameaça de onde quer que viesse. No entanto, não entendia porque uma criatura que dizia amá-lo, agora queria vê-lo morto. A angústia tomava conta dele. Apesar das visões que teve e das ameaças que acabava de presenciar, Raquel tinha uma sensação estranha com relação à Lívia. Sabia que ela agora era perigosa, mas sabia também que aquela não era a essência dela. Em suas premonições viu Bernardo e Lívia envolvidos, sabia que uma atração existia entre eles e aquilo lhe causava dor e raiva. Se Bernardo agora estava com ódio de Lívia, Raquel também não estava disposta a mudar este sentimento do coração de seu lobo. A paixão que tinha por ele era insana e egoísta.

Raquel olhou para Bernardo com os olhos cheios de libido. Aproximou-se dele deslizando a mão maliciosamente por seu tórax. Pela primeira vez Bernardo deixou que aquela excitação tomasse conta de seu corpo sem se transformar em lobo.

Faziam amor como um casal de humanos, quando Marie começou a bater insistentemente à porta do quarto. Irritado com a interrupção daquele momento único, Bernardo abriu a porta. Marie, inegavelmente assustada, disse: Lívia está aqui. Sinto a presença dela, mas não posso vê-la. Ao olharem para trás viram Lívia com as garras felinas no pescoço de Raquel. Asas enormes apareceram nas costas de Lívia. Os olhos azuis da felina/falcão agora estavam vermelhos e demonstravam um ódio que antes não existia.  Raquel morrerá se você não se entregar a Cirus antes do Ragnarok, Bernardo. A escolha é sua. Dizendo isso, Lívia levou Raquel pela porta da varanda do apartamento do nono andar.

sábado, 5 de novembro de 2011

Episódio 19

Lívia pairava sobre os lobos sem poder ser alcançada por eles. Sobre as costas do corpo dilacerado havia um arco e nas mãos uma flecha de prata que não chegou a ser disparada.
“Cirus o fez como fez a mim, e o enviou para impedir que você fosse coroado, já que acreditava que eu havia fracassado.” Disse Lívia para o lobo branco. Os lobos então recuaram.
“Este homem é exatamente como a fera que eu era há algum tempo atrás. Totalmente desesperado, faminto e sem controle. Sozinho jamais impediria sua coroação. Haverá o momento correto para o embate.” Lívia estava diferente, falava com uma determinação que não existia antes.
 “Tornei-me mais forte pela abstinência e adquiri outros poderes pelas maõs da própria Freya. Vim para avisá-los: O dia do Novo Ragnarok está próximo. Será a luta definitiva entre os descendentes de Fenris e os de Freya. Muito sangue será derramado, mas minha única certeza é a de que todos os lobos serão exterminados.”
Neste momento os trezentos lobos deram o bote em Lívia, que simplesmente desapareceu, deixando-os perplexos. Bernardo estava com os pelos eriçados. “No que depender de mim isto jamais acontecerá!” gritou.

segunda-feira, 31 de outubro de 2011

Episódio 18

Lívia foi para bem longe do litoral. Não se ouviu mais falar dela. O tempo passou. Hoje Bernardo completa trinta e três anos e herdará o trono de Arkan. Receberá também poderes superiores aos de qualquer lobo, inclusive de Fenris, que não é exatamente um lobo, mas um deus.
Após as tentativas malsucedidas de aniquilar Lívia, Fenris concluiu que ela não oferecia mais perigo. Cirus havia escolhido mal; sua representante foi forte o suficiente para lutar contra seus instintos naturais e afastou-se de seu objetivo.  
A Mata Atlântica estava cheia de lobos vindos de várias partes do mundo para presenciar aquele momento histórico. Depois de duzentos anos teriam novamente um líder e seriam novamente um raça unida e forte. Os lobos de hoje não eram predadores como seus ancestrais. Aprenderam a viver integrados aos humanos e a natureza. Não matavam animais porque aprenderam a se alimentar como os humanos. Precisavam das florestas para não ficar tão expostos quando transformados e não assustarem os humanos que ainda têm certas limitações em aceitar o novo, o diferente.

Tudo foi meticulosamente organizado para a coroação. Havia mais de trezentos lobos reunidos na Mata. Já era quase meia-noite. Bernardo receberia enfim os poderes de Arkan. O céu estava limpo, como previsto duzentos anos atrás. A lua parecia maior do que de costume, como se estivesse mais próxima da Terra.
Exatamente à meia-noite uma luz forte vinda diretamente da Lua envolveu o corpo de Bernardo. Aos olhos dos trezentos de sua raça ele transformou-se no glorioso lobo branco, recebendo poderes ainda desconhecidos. Após este momento um corpo dilacerado caiu de uma árvore e Lívia apareceu flutuando no ar com asas de falcão. Os trezentos expectadores transformaram-se naquele momento e armaram o bote contra Lívia.

sexta-feira, 28 de outubro de 2011

Episódio 17

A sensação era de desespero. Lívia sabia que tinha que aguentar o máximo que pudesse, pois se deixasse de ser espectro os lobos a encontrariam e a matariam.
Bernardo voltou a casa de Lívia sozinho. Atravessou a cozinha e próximo à porta do quintal disse: “Sei que você está aqui. Posso sentir seu cheiro. Eu jamais permitirei que matem você, mas ainda não tenho poderes suficientes para agir contrário às ordens de Fenris. Vá embora para bem longe da Mata Atlântica. Minha coroação está próxima, quando eu estiver mais forte poderei lutar de igual para igual com Fenris, e ele não poderá mais me dar ordens. Salve-se, porque não suportarei vê-la morrer.” Bernardo estendeu a mãos como se tocasse no rosto de alguém. Lágrimas reais escorriam por entre seus dedos e pelo seu rosto. Beijou a própria mão, sentindo o gosto salgado das lágrimas de Lívia. Neste momento sentiu uma sensação estranha, como se todo o seu corpo estivesse adormecido. Depois veio o formigamento e voltou ao normal.
O perfume de Lívia não estava mais presente no ar. Bernardo sabia que ela tinha partido e levado junto um pedaço de seu coração.

segunda-feira, 24 de outubro de 2011

Episódio 16

O que poderia ser pior do que a fome e a sede? Talvez ver a criatura que amava morta por suas mãos fosse pior. Aqueles instintos primários despertavam a raiva de Lívia e a vontade de ser violenta, mas o fato de ter consciência de sua condição ajudavam em sua luta interior.

Kara simplesmente não desistia de sua missão. Como não havia portas que a impedissem de entrar, falava com Lívia o tempo todo, como se fosse um surto de esquizofrenia.

Enquanto isso a alcateia, sob as ordens de Fenris, já havia decido visitar a casa de Lívia para exterminá-la. Bernardo e Raquel não eram a favor do ataque, tentavam argumentar, mas em vão. Fenris era um ditador, tinha bons motivos pra defender aquele extermínio e tinha poder para isso.
Lívia estava em seu quarto quando a porta da frente foi arrombada. Os seis lobos entraram. Bernardo e Raquel subiram a frente em direção ao quarto de Lívia, queriam, de certa forma, alertá-la do perigo que corria para que pudesse fugir. Entraram no quarto e não viram ninguém. Lui, Sebastian e Marie subiram logo atrás. Fenris permaneceu no andar térreo. Os lobos farejavam Lívia no quarto. Marie sabia que Lívia estava ali, mas não tinha como atacá-la enquanto ela fosse espectro. O ataque tinha sido em vão. Ao descerem as escadas Fenris disse: “Enquanto este espectro não manifestar sua violência felina não conseguiremos chegar a ela. Ela está conseguindo controlar sua fome, mas não por muito tempo. Quanto atacar de novo estaremos à espreita.”

sexta-feira, 21 de outubro de 2011

Episódio 15

Lívia tinha a cabeça cheia de pensamentos contraditórios. Havia guardado à sete chaves a atração que sentia por Bernardo, pois nunca pretendeu magoar Raquel, mas sucumbiu ao beijo e entregou-se à paixão. Apesar das contradições, apenas uma certeza ela tinha: não podia matar Bernardo. Decidiu que enfrentaria a fome e a sede, mas não se alimentaria mais. Estava disposta a viver como espectro, se isso mantivesse Bernardo vivo.
“Parabéns querida!” disse Cirus. “Você realmente me surpreendeu. Soube usar sua inteligência e seu poder de sedução para ganhar a confiança de sua presa. Excelente! Você sabe que, apesar de seus novos dotes, ainda não é capaz de matar Bernardo. Ele é mais forte que você e tem poderes que nem mesmo ele ainda conhece. Temos que ser precavidos. Além disso, precisamos aumentar nosso exército para o dia da grande batalha. Kara, a valquíria, continuará ajudando você a escolher os melhores soldados. Continue com sua missão e em breve terá sua vida humana de volta.” Cirus deu as costas à Lívia e desapareceu.

Lívia ficou extremamente desorientada com as palavras que tinha acabado de ouvir. Sentia que o silêncio a mantinha segura, pelo menos por enquanto, mas sabia que o inferno a aguardava. Pegou sua moto e dirigiu pela Rio-Santos, beirando o litoral, até chegar a Paraty. Parou a moto e ficou observando o mar. Kara apareceu.

“Boa escolha querida. Paraty tem ótimos recrutas. Em breve estará faminta e eu a ajudarei a fazer as melhores escolhas.” Lívia queria ficar sozinha. Estava com raiva e, se pudesse, devoraria kara. Resolveu então ser franca. “Kara, eu não fiz esta escolha. De início não soube lidar com este instinto assassino, mas agora tenho plena consciência dele e decidi que não matarei mais, mesmo que eu esteja condenada a ficar na forma espectral para sempre. Não perca seu tempo comigo.”

Kara deu uma gargalhada. “Sou sua serva, estou aqui para sugerir e seguir suas ordens, mas não se iluda, você não vai conseguir resistir à fome e à sede; é impossível.”

Lívia teve um acesso de raiva. Gritou com todas as forças que ainda tinha, subiu na moto e acelerou. Queria se ver livre daquela criatura.

Já estava bem próximo de Santos quando começou a sentir fome e sede. Sem que pudesse controlar derrapou e deixou a moto cair ligada no acostamento. Lívia era espectro novamente.
 

quinta-feira, 20 de outubro de 2011

Episódio 14


“Sr. Bernardo, tem mais uma moto próximo a sua vaga de garagem atrapalhando a passagem de outros veículos. Por um acaso ela pertence algum de seus hóspedes?” Perguntou Rubens, o porteiro. “Não, Rubens, não pertence a ninguém daqui de casa.” Respondeu Bernardo. “É minha, precisarei dela enquanto estiver aqui.” Bernardo surpreendeu-se com a voz grave atrás dele. Virou e deparou-se com um enorme lobo cinza de aparência monstruosa. O lobo então foi tomando a forma de um homem de meia idade, cabelos grisalhos, alto, com músculos definidos e traços duros.
“Você parece surpreso, Bernardo, não deveria. Sou Fenris, o deus. Precisei vir pessoalmente, já que, pelo visto, seu pai não lhe ensinou nada de como ser um líder. Diga, para o porteiro não tocar em minha moto e olhar novamente porque ela não está impedindo a passagem de nenhum veículo.”
”Desculpe Rubens, esta moto é nossa sim e já está estacionada corretamente.” Disse Bernardo gentilmente ao interfone. Rubens olhou perplexo para a vaga da garagem. A moto agora estava estacionada atrás da de Bernardo. Ele não havia escutado barulho nenhum na garagem. Não entendia como duas motos poderiam ter sido manobradas tão rápido. Não viu ninguém na garagem. “Desculpe Sr. Bernardo, mas como...?”
A arrogância de Fenris havia desequilibrado emocionalmente Bernardo, principalmente pelo fato de ter criticado seu pai, um sujeito de índole e moral admiráveis. A raiva fazia com que Bernardo tivesse começado uma transformação. Seus olhos estavam cobertos pela negra membrana e seu corpo começava a cobrir-se de pelos.
“Vê o que eu digo! Às vésperas de sua coroação não consegue nem dominar seus instintos mais primários. Você ainda é um fraco e tem muito que aprender. Se  Marcius não lhe ensinou nada, eu ensinarei.”
Neste momento Bernardo já estava na forma do lobo branco preparando o bote para Fenris. Imediatamente uma força invisível jogou-o para o alto. Quando caiu sentia-se sufocar, como se alguém apertasse seu pescoço. “Obrigada pela lealdade Marie, mas este cãozinho não é capaz de me atingir. Entendem agora porque foi necessário que eu viesse pessoalmente?  

segunda-feira, 17 de outubro de 2011

Episódio 13

Durante o jantar os três hóspedes traçavam planos para emboscar e eliminar Lívia. Raquel e Bernardo se entreolhavam e ouviam tudo sem opinar. Mesmo sabendo da gravidade dos fatos que estavam para ocorrer, havia uma dualidade de pensamentos. Lívia era uma amiga fiel, há algum tempo conhecia a condição de ambos e guardava o segredo. Além disso, Bernardo pode presenciar o sofrimento de Lívia. Ela tinha sido sincera com ele, contou que a missão que lhe foi incumbida não foi escolha sua, a vida nos moldes comuns foi-lhe tirada, para viver precisava tirar a vida de outro ser, e se quisesse voltar a sua condição anterior precisava matar o homem que amava. “Amor... por que ela não havia dito nada?” Bernardo perguntava a si mesmo tentando entender. Nunca percebeu nada. Até Raquel teve presságios deste amor. Bernardo olhava para Raquel com medo e tristeza. Desde que estavam juntos acreditava que ela era a mulher de sua vida – ou a loba de sua vida – e continuava a acreditar nisso. Tinha por ela um profundo amor. Também tinha medo que ela de alguma maneira tivesse pressentido o que ocorreu entre ele e Lívia. Não queria vê-la sofrer e, com certeza, ela sofreria se soubesse. Mas, seus pensamentos eram incoerentes. Lívia não saía de seu pensamento um só segundo. O que sentiu foi forte e o surpreendeu; não tinha como lutar.
“Esperem. Conhecemos todos os riscos, mas Lívia é nossa amiga. Conhecemos sua índole e seu caráter. Ela é tão vítima quanto nós. Deve haver algum jeito de resolver isso sem precisar matá-la.” Disse Raquel de forma imperativa. “Não precisamos matá-la, ela já morta. É uma criatura assassina apenas. Precisamos aniquilar inclusive sua forma espectral. Ela não é mais a amiga de vocês. Não se prendam a esta ilusão.” Disse Sebastian meio exaltado.
Havia um mal-estar no ar, o clima começou a ficar meio hostil. A alcateia titubeava. Faltava-lhe um líder; o macho alfa. Bernardo era o herdeiro de Arkan, mas ainda não era um líder, era um aprendiz.
Fenris assistia a tudo. Não podia deixar o grupo desunido. Tinha que liderar a alcateia. O interfone toca.

domingo, 16 de outubro de 2011

Episódio 12

Raquel já sabia que receberiam visitas quando o porteiro do prédio ligou, “Dona Raquel, Sr. Lui, Sr. Sebastian e Dona Marie estão aqui em baixo dizendo serem seus primos. Posso deixar que subam?” “Sim, claro Rubens.” Os três pegaram o elevador até o nono andar carregados de malas. Pela quantidade de bagagem, provavelmente, pretendiam ficar por um bom tempo.
Raquel ainda não os conhecia, mas recebeu-os muito bem. Acomodou Lui e Sebastian e um quarto e Marie em outro. O cheiro denunciava: tinha um suculento pernil sendo assado. “Meus queridos, é um prazer poder recebê-los em nosso humilde lar. Sei que vão ficar um bom tempo conosco, então espero que se sintam em casa. O jantar está pronto, mas vou esperar Bernardo chegar em casa para servir. Aí poderemos conversar todos juntos e vocês poderão explicar para Bernardo o porquê de estarem aqui,  o que está para acontecer e os riscos que ele corre.” Neste momento Bernardo abriu a porta. Ficou surpreso com a presença daquelas três pessoas que ele não conhecia. Cumprimentou-os com a gentileza de costume e pediu licença para tomar um banho rápido antes do jantar. Minutos depois sentaram-se todos a mesa.
Sebastian, um jovem loiro de olhos azuis com traços duros e voz firme, começou explicando: “Bernardo, como você sabe, em breve você completará trinta e três anos, será coroado nosso mentor e receberá os poderes de Arkan. Terá força inigualável e poderá ouvir os pensamentos de qualquer criatura. No entanto, Cirus, o último descendente de Freya, está recrutando um exército para impedir que você herde o trono de Arkan. Ele transformou uma amiga muito próxima sua em uma criatura assassina para te matar. Ela também é responsável por matar os escolhidos por uma valquíria para comporem um exército forte, com o objetivo de acabar com todos os lobos como nós. Nossa raça está ameaçada de ser aniquilada. Estamos aqui para ajuda-los a deter esta assassina e garantir sua coroação.”
Sebastian falava, mas Bernardo não conseguia prestar atenção em suas palavras. Olhava para Raquel e sentia-se culpado. Ainda estava inebriado com a sensação que teve pela primeira vez; transar como um humano. Ele sabia que ainda não tinha um domínio total de seu corpo, quando começava a ficar excitado, sua transformação começava. Tinha sentido um desejo muito forte por Lívia, mas alguma coisa, que não sabe o que foi, impediu que se transformasse. Pela primeira vez, sentiu-se plenamente homem, plenamente humano.
“Bernardo, Bernardo, hei! Onde você está com a cabeça? É a terceira vez que Lui repete a mesma pergunta.” Disse Raquel já meio impaciente.

sexta-feira, 14 de outubro de 2011

Episódio 11

Os acontecimentos dos últimos dias tomavam conta da mente de Bernardo tirando-lhe completamente o sossego. Só havia uma maneira de esclarecer aquilo tudo, e a chave era Lívia. Ele sabia que coisas muito estranhas estavam acontecendo, que Lívia não era a mesma, e que talvez estivesse realmente correndo algum tipo de risco perto dela, mas a curiosidade e algo mais inexplicável, diziam que tinha que voltar a casa dela e descobrir mais sobre tudo isso.  
Encontrou-a exatamente como no dia anterior, dormindo de bruços com os cabelos espalhados sobre o travesseiro. Não quis assustá-la e provocar outro ataque daquela felina, então sentou-se na cama e, acariciando seus cabelos disse: “Lívia, acorde, sou eu seu amigo Bernardo.” Calmamente Lívia virou-se olhando para os olhos de Bernardo. Um cheiro doce e inebriante espalhou-se pelo quarto. Tendo se alimentado na noite anterior, Lívia não tinha feições de gata. Parecia exatamente como sempre foi, a não ser pelo perfume no ar. Bernardo tinha muitas perguntas a fazer, mas aquele cheiro o embriagava, era um visgo invisível, mas irresistível. Olhando profundamente nos olhos de Lívia, aproximou seu rosto do dela e a beijou. Lívia também não via como resistir, e correspondeu. Bernardo puxou o lençol que a cobria; ela estava completamente nua. Afoito, tirou suas roupas e deitou sobre Lívia, que não fez nenhum movimento no sentido de impedi-lo. O desejo era forte e mútulo. Como se estivessem hipnotizados e embriagados, fizeram amor até que ambos se sentissem plenos.
“Cheguei aqui cheio de perguntas e não posso ir embora sem as respostas. Desde quando você tornou-se a felina que me atacou ontem? Quem te fez isso e por quê?” Lívia não conseguiu segurar as emoções contidas; as lágrimas corriam-lhe o rosto torrencialmente. “Não foi escolha minha. Um homem chamado Cirus me transformou nesta aberração. Não estou mais viva da forma como era antes. Meu corpo físico necessita se alimentar de outras vidas. Não tenho forças para lutar contra meus novos instintos; sou uma assassina. Daqui àlgumas horas estarei novamente faminta, este corpo ficará fraco até desaparecer e precisarei matar novamente.” Bernardo sofria vendo o sofrimento de Lívia. “E como isso pode ter fim?” perguntou Bernardo. “Assim que eu matar você. Esta é a minha missão. Mas estou condenada; porque te amo e não posso fazer isso.”

quinta-feira, 13 de outubro de 2011

Episódio 10


Enquanto isso em Bruxelas, na Bélgica...

“Lui, Sebastian, Marie, chegou a hora. Tenho uma missão de suma importância para vocês. Vocês são meus filhos, eu os criei, eu os ensinei tudo o que sabem, e a mim vocês devem ser leais. O trono de Arkan está ameaçado, assim como toda a nossa descendência. Como filhos de Fenris devem seguir para o Brasil e garantir a segurança do herdeiro do trono de Arkan a qualquer custo. Ele não sabe o perigo que corre. Cirus, descendente de Freya, criou uma arma assassina para aniquilar Bernardo. Ele transformou uma moça próxima das relações de amizade de Bernardo em um espectro assassino. O nome dela é Lívia. Ela está sendo orientada por uma valquíria chamada Kara. Elas estão ceifando vidas humanas que irão compor o exército de Freya para a grande batalha que se aproxima. Se Freya nos vencer povoará a mundo com criaturas espectrais assassinas. Nossa espécie corre o risco de ser aniquilada, mas isso eu não permitirei. Por isso estou lhes enviando ao Brasil.

Marie, com sua extrema sensibilidade e o poder da invisibilidade poderá perceber quando qualquer criatura espectral se aproximar de você, e não poderá ser notada, para sua segurança.

Sebastian, a você entregarei estas correntes de fios de seda extremamente fortes. Só elas podem deter as força das criaturas de Freya. No entanto, cuidado, estas correntes também podem imobilizar os lobos.

Lui, você tem o dom de hipnotizar quem se aproxima de você. Mas como não deve interferir no livre arbítrio de ninguém, sabe que seu poder de sugestão dura apenas alguns minutos. Tempo que usará a seu favor em casos de emergência.

Vão, e lutem por nós. Garantam que Bernardo herde o trono de Arkan e receba os poderes prometidos a ele por mim.

E não esqueçam: O que tem de ser será.”

terça-feira, 11 de outubro de 2011

Episódio 9

Lívia estava sendo consumida pelo desespero. Tinha fome, sede, sentia-se fraca. Caminhava pela praia do Gonzaguinha, próximo a São Vicente, não havia quase ninguém na praia naquele horário. Próximo àlgumas pedras havia um casal namorando. Lívia aproximou-se deles com fome. “Que cheiro é este Érica? O que você está usando?” “Não sou eu, Rodrigo.” O casal podia sentir o cheiro de Lívia, mas não sabiam identificar o que era. Lívia não conseguiu conter-se, suas garras apareceram, suas pupilas ficaram verticais e ela tomou a forma de uma grande gata negra. Apesar de não poder ser vista pelo casal, eles podiam pressentir a presença de alguém ou de alguma coisa estranha. Lívia preparou o bote, mas antes do salto uma mulher muito bela, em forma de espectro apareceu para ela, impedindo-a momentâneamente de atacar.
“Meu nome é Kara, sou uma valquíria. Cirus me pediu que viesse para orientar você. Sua missão é muito especial, como ele já deve ter adiantado. Sou apenas uma serva encarregada de orientá-la em suas escolhas.” Dizia Kara com uma voz angelical. “Mas que escolhas? A fome e a sede me consomem, não tenho forças para lutar contra isso.” Lívia aparentava sofrimento e desespero. “Nem deve lutar contra os instintos que lhe foram dados, mas tem que saber escolher, nossos guerreiros devem ser audazes e psicologicamente fortes. Rodrigo é um fraco. Érica não, é uma mulher perspicaz e inteligente; pode nos ser muito útil. Alimente-se apenas daqueles que possam ser bons soldados para compor nosso exército. A grande batalha está próxima.”
Lívia não podia mais suportar a fome. Como uma voraz felina, materializou-se para o casal, puxou Érica para as pedras, dilacerou seu pescoço e tomou todo o seu sangue, jogando os restos mortais no mar. Rodrigo, como grande covarde que sempre foi, corria desesperado rumo à avenida. Ninguém iria acreditar no que tinha acabado de presenciar.

segunda-feira, 10 de outubro de 2011

Episódio 8

Bernardo tentava se concentrar no trabalho, mas não conseguia. Saiu para almoçar e resolveu passar na casa de Lívia. Tocou o interfone mais ninguém atendeu. Com uma facilidade de atleta, pulou a grade de mais de dois metros e foi entrando. Tudo estava no mais pleno silêncio. Subiu as escadas. A porta do quarto de Lívia estava entreaberta. Pode vê-la dormindo de bruços. Seus longos cabelos negros espalhavam-se pelo travesseiro e pela cama. Aproximou-se silenciosamente. Podia sentir seu cheiro doce. Como um animal curioso, apoiou suas mãos sobre a cama, tentando observá-la mais de perto. Os pelos do corpo de Lívia se eriçaram novamente, era quase imperceptível, mas Bernardo conseguia notar. Assustada ela virou-se de costas e deparou-se com Bernardo olhando-a curioso. Suas pupilas estavam gigantes e verticais. Com um salto derrubou Bernardo no chão colocando suas grandes garras em seu pescoço.
“Hei, hei, hei, sou eu, seu amigo Bernardo.” Os olhos de Lívia foram voltando ao normal, as unhas diminuíram e como por encanto ela desapareceu em frente aos olhos de Bernardo. Apenas seu perfume permanecia no ar.
Os acontecimentos dos últimos dias o estavam deixando atordoado. Voltou para a oficina, mas não conseguiu mais concentrar-se nas motos. Ligou seu computador e foi pesquisar mais sobre gatos.
Na mitologia nórdica, a deusa Freya, a qual possui uma carruagem puxada por dois gatos, que representavam as qualidades da deusa: a fertilidade e a ferocidade. Esses gatos exibiam as facetas do gato doméstico, ao mesmo tempo afetuosos, ternos e ferozes. Os templos pagãos da região nórdica eram frequentemente adornados com imagens de gatos.

Bernardo continuava perplexo com as coisas que descobria em sua pesquisa. Enquanto isso, Lívia andava pelas ruas de Santos desorientada. Passava pelas pessoas e ninguém podia notá-la. A fome e a sede lhe consumiam.

domingo, 9 de outubro de 2011

Episódio 7


Raquel corria desesperadamente pela Mata Atlântica, sempre subindo, paralelamente à estrada. Por mais que Bernardo acelerasse não estava conseguindo manter Raquel em seu raio de visão. Abandonou a moto na estrada e transformou-se em um robusto lobo branco. Assim conseguia acompanhar Raquel em pé de igualdade. Depois de alguns quilômetros de perseguição Bernardo não sabia mais onde estava Raquel. Parou e começou a farejá-la. Logo a encontrou em forma humana, caída no chão e chorando muito.“Raquel, você está bem? O que acontece com você, meu amor?” Bernardo estava preocupado, nunca tinha presenciado uma reação assim de Raquel. Completamente nua, deitada no chão e aos soluços, Raquel tentava explicar. “Eu não comentei com você ainda porque não sabia ao certo o que estava acontecendo comigo, mas há alguns meses comecei a ter premonições. Eu vi aquele homem ruivo violentar a menina, vi também o corpo dele dilacerado boiando no mar.” Bernardo tentava acalmar Raquel dizendo: “Assim como os humanos, alguns lobos desenvolvem dons especiais. Mas você sabe disso. É apenas uma questão de aprender a lidar com esse dom que você está desenvolvendo.” Ao ouvir as palavras de Bernardo Raquel passou a chorar com mais intensidade, beirando o desespero. “Este é o problema! Minhas premonições. Vi Lívia transformada em uma grande gata negra... matando você!” Bernardo não pareceu preocupado. “Você sabe que seu dom está começando a aparecer. É uma novidade para você, não sabe lidar com isso ainda. Além disso, pense bem no absurdo que você falou: uma gata. Lívia está realmente estranha, alguma coisa está acontecendo com ela. Mas ela não é como nós, apenas conhece nossa condição. E mesmo que sua premonição estiver correta, que mal uma gata poderia fazer a um lobo?”
Raquel acalmou-se. Voltou a forma de loba, um belo animal de pelos vermelhos. Bernardo voltou a forma humana, vestiu o farrapos que sobraram de suas roupas, conseguindo esconder apenas o essencial. Subiu na moto e ambos voltaram para casa, cada um a sua maneira. Quando chegaram Lívia já havia ido embora, mas seu cheiro ainda estava presente no ambiente. Apenas Bernardo podia senti-lo. Era um cheiro doce. Sem que pudesse controlar seus instintos mais primários, aquele cheiro deixou Bernardo excitado.

sábado, 8 de outubro de 2011

Episódio 6

Raquel estava doente. Há três dias não sentia fome, o corpo inteiro doía, estava com uma febre altíssima, suava frio e começou a delirar...

... Estava presa em uma caixa de vidro no jardim da casa de Bernardo. Ele estava de costas, em pé, há uns vinte metros, olhando para a estrada. Lívia chegava de moto, descia e ia em direção a Bernardo. Tocava o rosto dele com as mãos e beijava seus lábios lascivamente. O coração de Raquel disparava, o suor corria-lhe pelo rosto. Bernardo correspondia apaixonadamente às investidas de Lívia. Ela abria os olhos e olhava diretamente para Raquel. Suas pupilas estavam verticais como as de um gato. Raquel sentia raiva e pavor. Lívia parecia gostar de estar sendo observada por Raquel sem que esta pudesse interferir. Bernardo tirava a camiseta; seu corpo estava coberto de pelos; ele estava se transformando em lobo. Lívia jogava Bernardo na grama e saltava sobre ele tomando a forma de uma gata enorme e negra. Bernardo parecia hipnotizado. O verde de seus olhos estavam cobertos por uma membrana preta. Os pelos negros do dorso da grande gata que estava sobre o lobo começavam a se eriçar. Bernardo continuava hipnotizado quando Lívia sacava suas grandes garras e dilacerava seu pescoço.

“Nãoooo!!!” gritou Raquel desesperada. “Calma querida, está tudo bem, você está delirando, depois de um banho frio vai melhorar.” disse Bernardo tentando acalmar a namorada. “Lívia está chegando e ficará com você enquanto vou buscar um remédio para acabar com sua febre”. Os olhos de Raquel foram tomados de pavor. “Não, não quero esta mulher em nossa casa!” gritou. “Mas ela é sua melhor amiga... além disso, escute, ela já chegou.” Raquel imediatamente transformou-se em uma loba de pelos avermelhados e saltou pela janela correndo em direção contrária à que Lívia chegava.

“Lívia, me desculpe, não sei o que está acontecendo com Raquel. A febre é tão alta que a esta fazendo delirar. Ela se transformou e saiu correndo. Tenho medo que faça uma besteira. Vou atrás dela.”

sexta-feira, 7 de outubro de 2011

Episódio 5

“Matar... eu não sou capaz de matar ninguém! Disse Lívia ao velho. “Não foi isso que eu vi ontem à noite, quando você pulou sobre aquele homem como uma verdadeira predadora, que agora você é. A propósito, deixe eu me apresentar. Sou Cirus, de um clã Dinamarquês de felinos, descendente direto de Freya.” Lívia estava atônita. “Quem é Freya? E onde eu entro nessa história? Você é uma alucinação?” Cirus deu um sorriso com o canto da boca. “Não querida, isso não é uma alucinação. Você foi escolhida por suas características para receber os poderes de Freya. É leal aos seus princípios, disposta a lutar até a morte contra injustiças, é ágil, forte, bela, sedutora e mortal, como pudemos ver. Sua missão é exterminar os lobos, nossos inimigos naturais, antes que eles acabem definitivamente conosco. Você foi escolhida também por sua fertilidade, para trazer ao mundo um descendente de Freya e garantir que nossa raça não seja dizimada. Eu sou o último descendente de Freya.”  
Nesse momento o interfone tocou. “Lívia, somos nós, Bê e Raquel, abra aí!” Assim que Lívia desligou o interfone Cirus havia sumido, e o perfume sumido junto com ele.
“Viemos porque estamos preocupados com você. Não atende o telefone durante o dia, parece que dorme o dia inteiro. Além disso, estamos intrigados: o corpo do estuprador foi achado hoje boiando no mar. Como você sabia que ele não iria mais atacar ninguém? Você viu alguém mata-lo? Disseram que o corpo dele foi encontrado com o pescoço dilacerado.” Quando chegaram bem próximos à Lívia os pelos do corpo dela se eriçaram. Bernardo e Raquel perceberam e Lívia sentiu-se constrangida. “Acho que estou ficando gripada, me deu um arrepio do nada.”

quinta-feira, 6 de outubro de 2011

Episódio 4

“Se não fosse a nossa condição, diria que algo de muito estranho está acontecendo com Lívia.” Dizia Raquel para Bernardo, enquanto observava a camiseta rasgada dele. “Não me olhe assim, já te disse para esperar que eu tire minhas roupas antes de se aproximar de mim. Ainda não consigo controlar meus instintos, basta você encostar em mim com segundas intenções que literalmente viro lobo. Você amadureceu mais rápido, como toda fêmea, e consegue controlar isso, eu ainda não.”

Bernardo e Raquel namoravam há pouco mais de um ano. Bernardo pertencia ao clã Akaja, uma antiga família de lobos originários do oriente. Raquel pertencia ao clã Klein, lobos provindos da América do Norte. Se conheceram por ocasião de uma cerimônia celebrada no Brasil onde Bernardo foi apresentado aos seus como herdeiro do trono de Arkan. Foi amor a primeira vista. Depois disso não conseguiram mais suportar a distância e resolveram morar juntos em Santos, cidade onde Arkan deveria se estabelecer em um futuro bem próximo.

Lívia era a única amiga deles que conhecia aquele segredo e conseguia encarar o fato com alguma naturalidade. Ela havia presenciado o começo de uma transformação de Bernardo por ocasião de um assalto a um posto de gasolina. Quando os ladrões chegaram Bernardo abastecia sua moto - uma XRE 300 cc, toda modificada para o estilo motard. Raquel tinha descido da garupa e estava próximo a moto de Lívia - suzuki 1250cc, também modificada por Bernardo e pronta para competições de arrancada, era quase uma "dragster".  Quando um dos bandidos desceu de um carro e empurrou Raquel para que ela saísse do caminho. Ela tropeçou e bateu com a cabeça no chão, desmaiando em seguida. Lívia e Bernardo abaixaram-se para socorrê-la, foi quando Lívia percebeu os pelos no rosto e nas mãos de Bernardo, assim como seus caninos que começavam a apontar. Ela ficou relutante em olhar nos seus olhos, mas não se conteve e o que viu foram duas "lanternas verdes" exalando fúria. Apesar de assustada, ambos continuaram a dar assistência à Raquel. “Eu vou socar este filho da puta que empurrou a Raquel, quero quebrar cada osso de seu corpo. Só vou quebrar, prometo que não vou aleijar” O sorriso maligno permanecia nos lábios, mas o verde dos olhos havia dado lugar a uma membrana preta que cobria toda a extensão dos seus globos oculares. Bernardo praticamente voou em cima do sujeito “- Pára Bê!! Chega!” - gritou Raquel, ainda ligeiramente zonza, mas em condições de parar Bernardo. Instantaneamente ele se acalmou e a fera que o possuía desapareceu. Lívia ainda segurava Raquel em seu colo quando ouviu uma sirene ao longe. “Estou com raiva, mas não sou um monstro.” – disse Bernardo. Depois deste episódio, uma conversa franca transformou Lívia e Bernardo em mais amigos que antes, além de cúmplices.

Era quase cinco da manhã quando Lívia chegou em casa. Dormiu quase que de imediato. Acordou ao anoitecer. Desceu até a cozinha, abriu a geladeira, mas não tinha fome. Reconheceu aquele cheiro inebriante que a fez dormir profundamente na manhã anterior penetrando  novamente por suas narinas. Assustada virou de costas e deparou-se com a figura de um velho alto e esguio, com uma postura elegante e imponente. “Querida, dei-lhe um presente ontem. Sua vida humana não pertence mais a você, em compensação dei-lhe a eternidade. Como espectro que agora é, pode ir a todos os lugares, mas não poderá ser notada. Só será percebida quando alimentar-se de sangue. Sim, como felina e predadora, sentirá necessidade de alimentar-se de criaturas vivas. Sem isso, permanece espectro. Dei-te este presente com uma condição: Quero que mate o herdeiro do trono de Arkan. Assim que o fizer terá sua vida humana e mortal de volta.”

quarta-feira, 5 de outubro de 2011

Episódio 3


Saciada, Lívia jogou aquele corpo inerte no mar. A raiva já não estava presente. Lembrou-se da menina e subiu a rua no intuito de socorrê-la, mas era tarde demais. A multidão que se aglomerava próximo à caçamba murmurava que ela estava morta. Um carro de polícia e uma ambulância chegavam ao local.

Há um quarteirão do Atlantis Bernardo e Raquel já avistaram Lívia e acenaram para que ela se aproximasse. Você demorou heim?! Está desprezando nosso sagrado chopp de toda sexta? Lívia ergueu as sombrancelhas e olhou para Bernardo cinicamente. Fiquei puta com a brincadeira! Bernardo não entendeu o comentário, mas não levou a questão adiante. Estava curioso para saber se Lívia sabia por que todos estavam descendo a rua, e como Lívia estava vindo no sentido contrário, talvez soubesse o que estava acontecendo.

Lívia contou: Encontraram uma adolescente morta perto da caçamba. Ela foi estuprada por um cretino e não resistiu aos ferimentos e agressões. Raquel e Bernardo ficaram chocados. Outra? É a quinta!  Lívia apenas confirmou o fato com a cabeça. Mas isso não vai mais acontecer. Bernardo e Raquel entreolharam-se. Raquel perguntou: Como você sabe disso? Lívia pensou no que tinha acabado de fazer. Não podia contar nada a seus amigos, eles não entenderiam. Não sei, apenas acho que cinco garotas mortas em menos de um ano é muito. Tomara que a polícia tenha conseguido prender este animal.

Lívia estava confusa. Não sabia o que tinha acontecido. O que a fez agir com tamanha brutalidade? Bernardo e Raquel sabiam que algo de muito estranho estava acontecendo com Lívia, mas não se espantavam mais com coisas estranhas. Afinal, lobos não se assustam fácil.


terça-feira, 4 de outubro de 2011

Episódio 2


Lívia queimou com a brincadeira de mau gosto. Levantou-se com raiva deixando a cadeira que acabava de tombar no chão. Bernardo e Raquel olharam com espanto para aquela cena.  Ela continuou caminhando entre as pessoas quando ouviu um choro baixinho. Foi caminhando no sentido do som por aproximadamente uns cinco quarteirões. Foi então que, atrás de uma caçamba de entulho, deparou-se com uma imagem assustadora.

Deitada no chão com as roupas rasgadas e sujas de sangue estava uma menina franzina de não mais que quinze anos. O resto de forças que ainda tinha só lhe permitiam soluçar baixinho. A menina estava nos braços de uma moça que passava pelo local. Lívia pode escutar quando a menina chorando disse baixinho:  Eu disse pra ele que não queria, mas ele continuou. Eu disse que estava me machucando e gritei para ele parar, mas ele começou a bater minha cabeça no chão. A moça que tentava, em  vão, socorrer a menina perguntou quem tinha feito aquela atrocidade. A menina apenas apontou para a esquina à direita e perdeu os sentidos.

Tomada de uma raiva incontrolável, Lívia correu até a esquina e viu um sujeito meio ruivo, magro e alto correndo em direção ao cais do porto. Mesmo de salto alto, conseguiu alcança-lo. Chegando a um metro do sujeito suas unhas saltaram dos dedos como as de um felino prestes a atacar. Suas presas apareceram e com a rapidez de um relâmpago saltou sobre o homem, cortou sua jugular com a unha do indicador e quando ele começou a sangrar sugou seu sangue com a voracidade de uma onça enraivecida e faminta.

Episódio 1

Sem mais nem menos, com as janelas e portas fechadas, aquele perfume doce e inebriante entrou pelo ambiente penetrando pelas narinas de Lívia deixando-a ressabiada. De onde vinha aquele aroma? Aos poucos ela foi tomada por uma vontade incontrolável de dormir. E foi o que fez. Eram dez horas da manhã, Lívia tinha se levantado as oito, tomado café puro, como de costume, e estava lendo seus e-mails. Fechou o notebook, deitou o travesseiro e dormiu profundamente por mais de doze horas.

Quando acordou já era quase meia noite. Não se recordava com o que tinha sonhado, mas sentia-se bem, como se alguma coisa muito boa tivesse acontecido. Estava muito bem disposta, bonita e feliz, resolveu sair de casa e caminhar um pouco. Colocou seu melhor jeans, suas botas pretas de salto agulha e uma blusa azul marinho que destacava ainda mais seus olhos muito azuis. Desceu a rua escura em direção à praça central. Era sexta-feira e o movimento dos jovens no local era grande, como de costume.

Avistou Bernardo e Raquel que tomavam um chopp sentados na porta do Atlantis. Puxou a cadeira e sentou-se. Os dois continuaram a conversar como se não tivessem notado sua presença. Que mania insuportável que vocês têm de tirarem com a minha cara! Quando o garçom chegou, pediu um chopp, mas ele também a ignorou.